A mim ensinaram-me que nunca se deve dizer nunca, e é algo que levo para a vida. Mas havia certas coisas que eu diria que a Humanidade nunca iria repetir, de tão vil, cruel, errado, inhumano e inaceitável. Pois admito: estava completamente e redondamente errada.
Olhava para as atrocidades do passado e pensava eu que tínhamos aprendido alguma coisa com isso e que seria impensável repetir. Mas... há sempre um mas...
A verdade é que, neste momento, já considero que o mundo, em geral, está num lugar muito estranho. Pensava eu que sociedades civilizadas tinham conseguido ultrapassar todos os erros do passado, que tinham evoluído. Mais uma vez não, estava redondamente enganada.
Para uma pessoa que não viveu na ditadura, mas nasceu relativamente perto dela e dos efeitos nefastos que produziu na nossa sociedade; para uma pessoa que viveu uma grande parte da vida sem internet e se maravilhou com este novo mundo que se abria diante de nós; para uma pessoa que viveu igualmente sem telemóvel, tudo isto parecia o caminho para o futuro. O caminho da informação, da instrução, da evolução do ser humano, do cair dos estigmas, do racismo, da xenofobia, da discriminação. Pois agora, mais facilmente, estas pessoas sentiriam que estavam erradas, envergonhadas por comportamentos completamente errados aos olhos de Deus e do mundo. E querem ver que eu estava novamente errada??
Sinto-me a viver numa certa Twilight Zone, onde, como na série, vivo histórias que misturam horror, ficção científica e superstição. Com a agravante de que isto é tudo real, está mesmo a acontecer...
2025 não é um ano em que existem mais ignorantes; simplesmente agora eles têm um telemóvel e acesso à internet. O que lhes permite destilar todo o ódio e frustração que sentem nos perfis dos outros. Há uns anos atrás, faziam-no no café da zona; hoje conseguem chegar mesmo a quem não frequenta os mesmos sítios que eles. Há uns anos podíamos escolher não ir a esse café, ou não ouvir essas pessoas. Agora, somos inundados por ódio e frustrações por essa internet fora. Muitas vezes chegam até à nossa casa virtual...
Estamos naquela fase em que se usa a democracia para implementar uma ditadura, e disso não tenho qualquer dúvida. Olhar para o que se passa nos Estados Unidos, para mim, é mais assustador do que ver um filme de terror. Como é possível? Ver as pessoas a radicalizarem as suas opiniões, destilarem ódio e frustrações e sentirem-se legitimadas, sem sentirem a vergonha que deviam sentir por serem tão más pessoas.
Ver as grandes empresas a vergarem-se a ditadores e a irem contra tudo o que apregoavam como diversidade, igualdade e inclusão. Ver censura de todos os que pensam de forma diferente ou fazem o mais básico, como fact-checking.
Sempre houve mentira associada à política: o florear das situações para não parecer tão mau, o dizer por outras palavras mais suaves o que se quer implementar sem parecer tão duro com a população. Claro que só se engana quem nunca quis saber de política ou de políticos. Mas agora, mentem com todos os dentes que têm na boca e com a boca aberta... Num dia dizem uma coisa, no outro, completamente diferente. Assim, sem vergonha.
E parece que a mentira, que antes era uma vergonha, agora é normalizada. As pessoas estão cada vez mais indiferentes aos valores, apáticas e cegas por palavras ocas e vazias cujo único objetivo é chegarem ao poder — nunca ajudar essas pessoas. E assim conseguiu-se convencer os pobres de que o problema da pobreza deles são os mais pobres que eles.
Confesso que nunca pensei chegar a este ponto.
Nunca fui de meter a cabeça debaixo da areia, de fazer de conta que nada se passa ou de não lutar pelos nossos direitos. E quanto mais velha fico, mais impressão me fazem as pessoas que tentam passar entre os pingos da chuva, que são incapazes de dar a sua opinião, e até de assumir a sua opinião.
"O problema do mundo é que os estúpidos são cheios de certeza e os inteligentes cheios de dúvidas." — Bertrand Russell